Com cinco nomeações ao Oscar 2024, inclusive a de Melhor Filme, #TheZoneofInterest, embora seja focado num passado recente, é um trabalho que nos fala muito de perto sobre o presente; sobre nossas atitudes de desviar o olhar do que não nos agrada e fingir que nada de anormal está acontecendo na porta ao lado, na cidade vizinha, no país distante. É sobre fuga e negação de tristes realidades em prol de nossos confortos pessoais. É sobre mentir para si mesmo, é sobre criar uma realidade paralela que não condiz com os fatos. É sobre redes sociais. É sobre a hipocrisia nossa de todos os dias e sobre declarações promovidas pela senilidade etílica.
O novo filme do cineasta inglês, Jonathan Glazer, é centrado no campo de extermínio de Auschwitz e, genialmente, não é mostrado nenhuma das atrocidades de Auschwitz. O que vemos, sempre e, à primeira vista, é uma cenografia idílica, um lindo lago propício a piqueniques, uma horta impecável e farta, festas na piscina, um quintal amplo repleto de rosas, dálias e muros cobertos com belas trepadeiras floridas, belos passeios a cavalo em verdes pradarias em volta de uma casa imaculada, brilhante e asséptica onde reside uma família aparentemente próspera e feliz com seus cinco filhos.
A Zona de Interesse é uma livre adaptação do romance de Martin Amis de 2014, que retrata a vida na casa do arquiteto e comandante, Rudolf Höss, responsável pelo enorme complexo onde ocorreu a maioria dos extermínios que conhecemos como Holocausto. E sim, esse inferno ficava separado de sua idílica residência por apenas um muro e insignificantes três quilômetros de distância.
Artisticamente falando, a genialidade do roteiro está no fato que não vemos as barbáries do outro lado, pois as 10 câmeras digitais, penduradas nas paredes gravam apenas a aprazível vida familiar do monstro enquanto um olhar mais atento vai coletando pequenos fragmentos, insinuações, situações rápidas, pequenas ações, gritos, tiros, conversas aparentemente inofensivas que nos são facilmente e tragicamente dedutíveis e reveladoras do terror tão próximo e tratado com enorme e chocante indiferença.
Construindo quadro a quadro, dentro do bucólico cotidiano, Glazer nos mantém presos ao seu enredo ajudado pela trilha sonora perturbadora e por mais uma interpretação magnífica da Sandra Hüller dentro de uma narrativa sem uma única gota de violência, mas com toneladas de uma atmosfera angustiadamente cruel e devastadora, construindo uma versão ousada e inovadora de um período e de fatos tão abjetos da história da humanidade. Basta estar atento as sutilezas dos subentendidos e significados e suportar, emocionalmente, a banalização do indescritível.
Será mesmo que naquela época e situação bastava apenas fechar as cortinas ou continuamos fechando-as inapelavelmente também nos dias de hoje?
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