Ao fim e ao cabo desta temporada, a série vencedora do Emmy 2017 e que, principiantes e amadores da teledramaturgia classificam como a ”Melhor de todo o sempre”, foi uma oscilação só! Se, a segunda temporada se afastara do livro de Margaret Atwood, indo por caminho mais sombrio que a obra impressa e, literalmente, embromado no desenvolvimento, a terceira que abre com o episódio “Night”, também anda em círculos em torno de uma revanche e cometendo uma gama de perceptíveis enganos estruturais no roteiro.
É impossível fazer um detalhamento minucioso não só por conta da limitação dessas linhas, mas também para jamais entrar na esfera dos spoilers, porém é inconcebível que uma criança sem nenhum vínculo sanguíneo ou emocional provoque na mãe adotiva (e num governo), tantas ações potencialmente dramáticas causando um quase incidente internacional. E, como se não bastasse, no episódio “Useful” (3), um enorme susto ameaça a destruição da originalidade da obra: Uma fala da protagonista aponta para gravíssima, populista e radical mudança de atitude da protagonista para atrair público sedento de mais do mesmo e, pra piorar, em “Unfit” (8), esperadíssimo por revelar as motivações da importante personagem Tia Lydia, perde o rumo mantendo a trama no presente de Gilead ofertando ao público apenas três blocos de flashbacks da personagem que não revelam absolutamente nada de importante ou de novo sobre ela. Frustrante!
Ainda nele foi decepcionante constatar o sem mais nem menos da mudança de caráter da protagonista, que arquiteta vingança pessoal e maquiavélica contra uma colega grávida. Como assim? Uma personagem (por mais que tenha sofrido), não se transforma moralmente do dia pra noite e os “showrunners” sabem dessa premissa muito básica da dramaturgia, mas a vilanizaram e insistiram nisso mais além (passando por simplista explicação), em "Sacrifice” (12). Não, June não é assim e o salto de mulher indefesa para empoderada, de vitima para pretensa guerrilheira, atende apenas a uma estratégia de impacto meramente comercial: Mais uma heroína de capa contra sistemas...
Infelizmente, para olhos mais treinados, a temporada perdeu várias chances de aproveitar ótimas tramas em capítulos que não avançavam, com evidentes problemas de ritmo apenas mudando os locais, mas repetindo velhos batidos conflitos, exagerando nos planos longos que em nada colaboram com um arco dramático que marca passo esquecendo-se de contextualizar informações sobre a estrutura do governo, (cenário base de toda a trama), tropeçando aqui e ali na dialética narrativa para deslumbrar um público recém saído das novelas. A prova disto é que em Mayday (13), último episódio da temporada, surge uma “La Femme Nikita” usando todos os clichês emocionais como crianças e abnegações altruístas enquanto o roteiro apóia as inverossimilhanças de um plano de fuga onde a rota de escape só é estudada depois que a ação está em andamento.
Ok que tecnicamente é irrepreensível no design de produção em altíssimo nível, na deslumbrante e acertada fotografia com fortes e ainda assim melancólicos contrastes, nas belas tomadas panorâmicas sempre em perspectivas muito assertivas, na belíssima, elegante e simétrica estética de conjunto, trilha sonora e, claro, no elenco primoroso que faz com que os vários problemas passem despercebidos pelos iniciantes. Elisabeth Moss segue enorme no papel (embora tenha tendido para um “overacting”) enquanto Yvonne Strahovski acumula muitos pontos com atuações minimalistas e inesquecíveis.
Assim, mesmo com narrativa apática e com o desenho final da obra muito longe qualitativamente da temporada inaugural (e do livro), #Thehandmaid’s tale entretém satisfatoriamente por conta da proposital distopia temática que, aos olhos de uns, amolda-se como um libelo de resistências para catarses individuais, mesmo que, natimorto e estéril sejam, até agora, os desenvolvimentos do pós-livro.
Sim, é preciso ler pra entender...
Ps1: Disponível no canal Paramount e a primeira temporada no Globoplay
TRAILER