Testamento - Canadá – 2023
- Cardoso Júnior
- 7 de jul. de 2024
- 2 min de leitura

Análise nº 1.672
Sempre gosto de insistir que para gostar ou não de um filme, é muito importante conhecer a linguagem, o estilo ou a carreira do diretor para uma melhor compreensão não só dele, mas do conjunto de sua obra. E, este também é o caso do diretor e roteirista canadense, Denys Arcand, conhecido por suas obras, todas sempre provocativas visando as reflexões ou debates do público.
E, #Testamento, seu último filme, que andou rapidamente pelas salas de cinema, não foge a regra.

Vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, em 2003, pelo espetacular “As Invasões Bárbaras”, Arcand lançando mão da sátira, centra sua estória em uma casa de repouso para idosos onde tudo é absurdamente perfeito até que... surge, do nada, um grupo de ativistas exigindo, através de ruidosas manifestações no jardim, que uma pintura no interior do prédio seja retirada, pois agride o “politicamente correto”.

Partindo deste plot, o roteiro aproveita para construir uma forte crítica social - com humor, mas nunca cômica – abrangendo o capitalismo, o desgoverno dos que governam que só fazem o que lhes beneficiam, o sistema de saúde de Quebec, a paranoia sobre como viver uma vida saudável, a atual “moda” dos cancelamentos entre outros assuntos do mundo contemporâneo, todos sob a lente de aumento da sátira inteligente.

Através de personagens coerentes – com suas óticas – diálogos, frases inteligentíssimos, ferinos e profundamente irônicos, o protagonista e condutor da trama, segue nos levando por um caminho de grande desconforto com o mundo atual que vai se abatendo e agigantando diante da “velhice” quando tudo ao redor vai perdendo o significado outrora existente em prol de uma ressignificação que não faz sentido algum.

A reviravolta (algo previsível) que o roteiro nos apresenta da metade para o final serve para enfatizar a contundente e inteligente crítica aos estereótipos que formatam a base do “politicamente correto” e da artificial inversão de valores e modismos que subjugam a humanidade como um todo fortificando um pessimismo abrangente escamoteado para as raias da normalidade mundial.

Em um mundo onde os roteiros tendem repetir e repetir fórmulas desgastadas, porém rentosas, é muito bem-vindo um cineasta como Arcand que não tem nenhum medo de provocar, de se arriscar grandemente ao criticar o status quo atual, instigando um público pensante (ele deixa claro que a burrice dominou o mundo) a se rebelar, ainda que apenas internamente, contra a passividade da aceitação de normas, regras e costumes que não fazem nenhum sentido, mas que as pessoas adotam para parecerem modernas.
A ótica realista e a ironia deste genial cineasta são vitais para o cinema, ainda que, talvez, seja seu último trabalho na sétima arte, mas certamente um grande legado para que pensemos e avaliemos antes de apenas seguir a boiada.

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