Após décadas afastada de sua terra natal, Ronit Krushka retorna para casa, quando morre seu pai, rabino em uma sinagoga ultraortodoxa, e reencontra os amigos de infância Esti e Dovid, o último, discípulo e sucessor de Rav Krusha, casados. Entretanto, os motivos de seu afastamento reflorescem quando Esti revela que foi ela quem avisou a amiga da morte de seu progenitor.
Com um roteiro linear, sem flashbacks, Sebastián Lelio e Rebecca Lenkiewicz revelam o passado dessas personagens em cadência oportuníssima, exclusivamente através de diálogos e, em paralelo, retomam, no presente, os conflitos que levaram Ronit a fugir décadas antes. Com grande delicadeza, ilustram, em uma comunidade ultrarrígida, a ação do destino sobre duas mulheres que se amaram no passado, e ainda se amam, separadas pela escolha pela fuga e liberdade de Ronit e pela permanência de Esti, abordando a ação da sociedade e da religião para condicionar sua sexualidade aos padrões esperados por essas; a ação dos desejos mais íntimos no reencontro das duas amantes; e o confronto entre a libido e as convenções sociais, elevando as tensões e conflitos em ritmo progressivo até a surpreendente conclusão. Adicionalmente, evidencia as motivações que levam apenas a Esti a incumbência de comunicar a Ronit do falecimento de seu pai.
A direção de Lelio, diretor e roteirista de Uma Mulher Fantástica, que ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro este ano, é ainda melhor, reforçando as tensões através da cadência impressa e de closes contundentes e belos, que podem ser melhor observados na cerimônia fúnebre na sinagoga quando Dovid assumiria como rabino. Rachel Weisz e Rachel McAdams conferem, com enorme esmero, a sintonia contida necessária à credibilidade de suas personagens no contexto social-religioso apresentado e Alessandro Nivola surpreende positivamente em atuação profunda e precisa. Tanto a fotografia, quanto a música contribuem para o esquadrinhamento e progressão dos conflitos e tensões em cena. A arte contextualiza com perfeição a comunidade em questão e a edição é ótima.
Um tema, tão recorrente na atualidade e previamente abordado pelo diretor, correria o risco de se tornar repetitivo, mas Lelio e Rebecca conferem a originalidade e a singularidade imperativas à sua relevância. Não perca.
PS: Em cartaz.
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